30 novembro, 2007

O rei e o índio

Salvador Dali
Luiz Pilla Vares

Porto Alegre - 22/11/07

Nunca um bate-boca rendeu tanto noticiário como este entre o rei Juan
Carlos, da Espanha, e o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.
Mas é evidente que, por trás dessa repercussão, está a tentativa deliberada
de desqualificar o presidente Chávez que chamou o ex-primeiro-ministro
espanhol, José María Aznar, de fascista.
Chávez não estava longe da verdade, já que Aznar é ligado a uma das organizações mais conservadoras da Europa, a Opus Dei.
O despropositado no fato do bate-boca foi a audácia do rei espanhol em querer mandar o líder venezuelano calar a boca, como se fosse um Carlos V ou um Filipe II e como se a velha monarquia espanhola ainda fosse dona da América
Latina.
O rei parece não se dar conta que séculos transcorreram e a
América Latina hoje é republicana, inteiramente republicana, ainda
mais agora quando os povos indígenas, quase eliminados fisicamente
pelo colonialismo espanhol, retomam o seu lugar na história,
sem canhões, no voto e nos movimentos sociais.

O mestiço Chávez, muito mais para índio do que para branco, é fruto dessa revanche.
É verdade que ele não dá muita bola para a linguagem diplomática e não tem papas na língua. Se é para chamar o presidente Bush de diabo, chama. Se é para chamar Aznar de fascista, chama. E não se achincalha diante do rei, aliás, um rei que
recebeu a coroa do ditador Francisco Franco.
Felizmente, há muitos brasileiros que não se deslumbram com a arrogância e a prepotência de Juan Carlos.
Mauro Santayna, do Jornal do Brasil, é um deles: "O presidente Hugo Chávez é descuidado e franco no que fala. Usa em sua retórica antiimperialista, metáforas quase divertidas, como chamar Bush de diabo. Mas não exagerou ao qualificar o ex-primeiro-ministro espanhol José María Aznar de fascista. Aznar, produto típico da Opus Dei, que se reorganiza com novo alento na Espanha, sempre tratou a
América Latina com desdém".

Em compensação, um prestigiado colunista aqui mesmo de Porto Alegre saiu em defesa do rei e qualificou Chávez de "bufão". O cronista escreve bem quando trata de gostosos textos sobre o passado da capital gaúcha e de nossa imprensa. Mas foi um desastre quando se meteu no bate-boca do rei com Chávez.
E, ainda pior, no dia seguinte, para glorificar o rei, deu o exemplo de Alcazar, durante a guerra civil espanhola nos anos 30. Afirmou que Alcazar era a Espanha. Mas não disse que os defensores de Alcazar eram fascistas, sequazes de
Franco, que venceu a guerra contra os republicanos, graças ao auxílio
de Hitler e Mussolini.
Nem lembrou também que a Espanha foi também Guernica. Este rei arrogante que trata as lideranças da América como se fosse ainda dono de nosso espaço teve de encontrar pela frente a altivez de dois latino americanos: Chávez da Venezuela, que ousou desafiar abertamente o império norte-americano e Ortega, sandinista
histórico da Nicarágua.

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