09 agosto, 2012

Noites de manteia

Toda noite, sem exceção, desde quando completara o décimo-terceiro ano de vida, hoje já com 66 de idade, Eliseu Eleusis tinha aquele pesadelo. Fizera tudo, pense em qualquer coisa, mesmo essa já tentara... E nada mudava suas noites. Acordava urrando, sobressaltada, os pulsos sangrando de sulcos há muito cicatrizados, sempre reabertos.
Levantava e ao mirar-se no espelho da cômoda, após acender a lâmpada da pequena luminária de apoio sobre o criado mudo, nada enxergava.
Não se via.
Seguia até o banheiro, o próximo espelho, também ali não aparecia imagem sua.
Só na casa, corria de um cômodo ao outro, pés descalços, inverno ou verão, buscando a própria imagem em algum espelho ou vidraça.
Desesperava.
Tenso, banhado em suor gélido, arrastava-se de volta ao dormitório. Um rastro fino de sangue no assoalho, as linhas quase paralelas perfeitas vertidas dos pulsos nunca chegavam à roupa de cama, lençóis, colchas ou cobertores, quais fossem.
Ali, Elêusis sempre se reencontrava esticado na cama, em profundo e plácido sono.

[ Adroaldo Bauer Corrêa, especial para o Vale das Sombras ]

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