25 março, 2021

 JÁ NÃO ERA VERÃO

A enfermeira sai do segundo plantão da semana. Olha o céu cinza chumbo. Chuvisca, o piso começa a molhar. Esqueceu onde deixou a sexta sombrinha que comprou "nestes tempos" de pandemia.
Se dá por conta que essas águas são as que fecham o verão, como diz aquela música linda do Tom Jobim.
Distraída, tropeça numa laje quebrada da calçada e vai cair nos braços de um rapaz forte que a contém.
Ambos de máscara, trocam olhares assustados. O dele é azul. O dela, verde claríssimo.
O tempo parece parado. O coração dela acelerado. Do susto. Do amparo inusitado?
Agradece o socorro providencial, a voz miúda, rouca por trás da máscara.
Percebe que os olhos dele se iluminam ainda mais, adivinha um sorriso por trás do pano vermelho.
- Eu que lhe agradeço. Há seis meses eras quem me segurava pra virar de lado no leito ali na UTI, diz. apontando o nariz afilado no rumo do terceiro andar do hospital.
- Vim aqui lhe agradecer, disseram que já saíras. Aceitas um café.
- Está tudo fechado...
- Eu trouxe uma térmica, e tenho uns croissants ainda quentinhos, queres.
Já equilibrada, os olhos úmidos, diz ao homem que sim. Ato contínuo, ele lhe alcança o braço do jeito que o ensinara no quarto.
(C) Adroaldo Bauer Corrêa
Carmen Helena, Neli Germano e outras 53 pessoas
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