15 agosto, 2011

Muitas lições na derrota no Gauchão de Literatura 2011

JOGO 13 – Anjo das ondas x O império bandido














Anjo das ondas, de João Gilberto Noll (Scipione / 2009)
O império bandido,
de Adroaldo Bauer (Edição do Autor / 2010)


JUIZ
João Kowacs Castro – Atualmente desenvolve projetos culturais em prédios ocupados no centro de São Paulo com o coletivo Comboio (www.comboio.org). Além disso, é um dos roteiristas/diretores da produtora em trabalho de parto Puta Filmes (putafilmes.com) e o responsável pelo texto no work in progress LURDS (lurds.tumblr.com), os dois em parceria com Daniel Eizirik. Em 2009, lançou pela editora Dublinense o livro de contos O Ideograma Impronunciável. Está disponível para conversas, projetos, mecenato e amizade forte através do e-mail samlout@gmail.com.


Os jogadores
O império bandido, de Adroaldo Bauer
Tanto o título quanto a capa me chamaram a atenção. O título (e a sinopse) pela magnitude das palavras escolhidas. A capa (e a contracapa) por serem inusitadas. A trama é focada na história de Carlota, uma heroína que cruza situações dramáticas e extraordinárias, ao longo de um mergulho no mundo do tráfico de drogas e da corrupção. É uma história policial que parece feita nos moldes das histórias policiais à moda antiga. Existem vários personagens, reviravoltas, complôs, mocinhos e bandidos. A linguagem segue essa toada “de época”, somada a regionalismos pitorescos. A maior parte da ação se desenrola em uma cidade não identificada de um universo paralelo ao Rio Grande do Sul.
PS: Gosto da “Carta a pessoa que lê”, prefácio feito pelo próprio Adroaldo. No entanto, acho que ela poderia estar no final do livro. O testemunho elogioso de Glória Athanázio sobre o livro me deixou desconfiado por ser muito pessoal e pouco literário. Sugiro a quem for ler o livro que leia os prólogos depois da história.
O anjo das ondas, de João Gilberto Noll
O título, a capa, a frase que estampa a contracapa, bem como o livro inteiro, chamam a atenção pelo bom gosto e pelas escolhas cuidadosas. As frases são belamente desenhadas e a narrativa é livre, oscilando entre a primeira e a terceira pessoa. A história do livro é o conflito de identidade de Gustavo, um garoto carioca que mora há muito tempo em Londres e retorna ao Rio de Janeiro.

O jogo

O árbitro gira a moeda, apita e Adroaldo Bauer sai com a bola. João Gilberto Noll, com um carrinho, rouba a bola, dribla e chuta, marcando um gol nos primeiros segundos.
Os cães faziam aquele som esfomeado, a respiração no extremo da capacidade, respiração de quem é submetido à servidão do instinto.
A torcida corneteia o pessoal d’O império.
Rola a bola novamente, Adroaldo se aproxima perigosamente do gol e chuta.
Por fim, recurso aprendido com os mendigos nas rondas de rua: enfiou jornal velho nos sapatos, molhados na chuva para chegar de casa até ali, caminho diário de um pouco mais de dois quilômetros percorridos a pé, em qualquer condição de tempo. Noll defende, sem se atirar no chão. Sentei em um balanço, querendo com certeza reinstalar a criança em mim.
Noll avança novamente e Adroaldo não consegue segurar o jogo aéreo.
Aos 20 minutos do primeiro tempo, o clima é tenso entre as torcidas.
Noll fica na cara do gol, manda um foguete e acerta o travessão da goleira.
Ele não queria nada, nem mesmo a namorada: queria partir para o pólo norte, África, Uganda, talvez, quem sabe depois as estepes geladas, voltar dessa aventura como um pequeno herói a desbravar agora seu próprio coração, sentindo falta do que ficara de si mesmo em algum lugar impenetrável, no meio da floresta – o corpo em febre bebendo o caldo cálido da planta que pode ser balsâmica ou venenosa, ele verá…
Ninguém se move no estádio.
A bola cruza o campo e cai na cabeça de Adroaldo, ao lado do gol, que, com uma cabeçada instintiva, fura a defesa do Anjo das ondas.
Saiu lépido, silencioso, sem rebate, um risinho zombeteiro sob o bigode aparado fino, adivinhando romance no ar.
GOL!
A tensão é demais, começa o quebra-pau entre as torcidas e o juiz teme ser necessário encerrar a partida em pênaltis.
No entanto, Noll, que faz bonito no Anjo das ondas, acaba marcando um gol de misericórdia no anacrônico, mas cheio de raça, time de O império bandido.
Placar final, 2 x 1.
E chega de futebol.

Apesar de muito bem escrito, com um bom ritmo (122 páginas), a voz do narrador de Anjo das ondas é muito distante do universo que se propõe a retratar. Os conflitos do personagem central são consistentes e delicados, talvez até demais.
Enquanto isso, O império bandido, com seu ritmo truncado, história saturada e sintaxe antiquada, é charmoso dentro de suas escolhas incomuns, apesar de ter sido demorado demais para ler. Conceitualmente, é interessante a sequência causal de acontecimentos dentro do universo familiar de um gênero narrativo, com referências fortes ao Rio Grande do Sul, narrado (na terceira pessoa) por uma voz muito característica. Mas a forma do livro como um todo (230 páginas) acabou gerando problemas de ritmo.

PLACAR
Anjo das ondas 2 x 1 O império bandido



Publicado em 15/08/2011 por Equipe CGL
http://gauchaodeliteratura.wordpress.com/

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